Você não pode mudar o que sente, mas pode aprender o que fazer com seus sentimentos. Nós do LIV – Laboratório Inteligência de Vida – acreditamos nesse conceito e por isso levamos para escolas de todo o Brasil um programa de educação socioemocional que ajuda estudantes a conhecerem seus sentimentos e a desenvolverem habilidades para a vida.
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A pena de morte ainda acontece em diversos países ao redor do mundo. Ela não ocorre no Brasil há muito tempo, mas os frequentes casos de violência fazem com que boa parte da população brasileira seja a favor da volta dessa forma de punição. Por isso, nesta página, apontaremos os principais argumentos dos defensores e opositores do assunto no Brasil. Confira a seguir.
O QUE É PENA DE MORTE?
A pena de morte, também chamada pena capital, é um processo pelo qual uma pessoa é morta como punição por um crime cometido. Mas não é qualquer tipo de morte. Ela precisa ser realizada pelo Estado após decisão judicial, que condena uma pessoa à sentença de morte. É diferente de uma execução, que consiste na morte de uma pessoa sem processo legal que a autorize.
A pena de morte não é um instrumento novo no mundo. A execução de criminosos e opositores políticos foi utilizada em diversos momentos da história, inclusive no Brasil. Vamos entender o contexto da pena de morte no Brasil?
A PENA DE MORTE NO BRASIL
A última vez em que a pena de morte para crimes civis foi aplicada no Brasil foi em 1876, ficando oficialmente proibida após ser retirada do nosso Código Penal com a Proclamação da República em 1889.
Segundo o jornalista Carlos Marchi, autor de um livro sobre a pena de morte no Brasil, a principal finalidade da pena capital era reprimir e amedrontar os escravos. Por isso ela foi retirada do Código Penal após a Proclamação da República, já que um ano antes a escravidão havia sido abolida.
Essa mudança tornou o Brasil a segunda nação das Américas a abolir a pena de morte para crimes comuns, ficando atrás apenas da Costa Rica, que aboliu a pena capital em 1859. Isto quer dizer que a pena de morte foi completamente abolida no Brasil?
Não é bem assim! A pena capital é proibida pela lei brasileira em casos de crimes civis, mas a nossa Constituição permite que ela seja aplicada em casos de crimes cometidos em tempos de guerra. É o que diz o inciso 47 do artigo 5º da nossa Constituição: “não haverá pena de morte, salvo em caso de guerra declarada”.
Os crimes que podem levar a essa punição estão escritos no Código Penal Militar e a pena prevista é execução por fuzilamento. Alguns exemplos desses crimes são:
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traição (como pegar em armas contra o Brasil ou auxiliar o inimigo);
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covardia (por exemplo fugir na presença do inimigo);
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rebelar-se ou incitar a desobediência contra a hierarquia militar;
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desertar ou abandonar o posto na frente do inimigo;
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praticar genocídio;
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crimes de roubo ou extorsão em zona de operações militares; entre outros.
Ainda que a pena de morte em caso de guerras continue a existir no nosso ordenamento jurídico, ela nunca foi colocada em prática, nem mesmo na segunda guerra mundial, último conflito armado em que o Brasil se envolveu.
Durante o regime militar, um decreto chegou a restabelecer a pena de morte para crimes políticos violentos. Contudo, mesmo que alguns presos políticos tenham sido condenados, a pena capital nunca chegou a ser aplicada e nenhuma pessoa foi morta dentro dos limites do ordenamento jurídico.
Os constantes casos de violência colocam em questão se as punições aplicadas no país realmente são suficientes, principalmente para crimes considerados bastante graves. Ainda que o governo até então não tenha demonstrado interesse em recolocar a pena de morte no ordenamento jurídico, há quem defenda a volta dessa forma de punição.
Uma pesquisa realizada pelo Datafolha, em setembro do ano de 2014, revelou que 43% dos brasileiros naquela época, era a favor da pena de morte, enquanto 52% se posicionaram contra. Muitos dos que se posicionam a favor utilizaram como principal argumento que a pena de morte reduziria a violência no Brasil e diminuiria os gastos com ressocialização dos presos, uma medida que poucas vezes funciona.
Para os favoráveis à pena de morte, ela é a única forma de garantir que criminosos não retornem à sociedade ou cometam outros crimes dentro da prisão. Os que discordam dessa posição argumentam que a defesa da pena de morte no Brasil é guiada puramente por sentimento de vingança, sem qualquer motivação racional, o que faz com que a sociedade não perceba as desvantagens que a punição pode trazer, como desperdício de recursos que poderiam ser melhor utilizados na recuperação do preso.
Um estudo realizado com 67 pesquisadores estadunidenses, especialistas na temática da pena de morte, e publicado pelo Jornal de Lei Criminal e Criminologia da Universidade de Northwestern, em Chicago, mostra que, para 88,2% deles, a pena de morte não tem qualquer impacto sobre os níveis de criminalidade. Para eles, não existem quaisquer dados ou estudos provando a relação entre a pena de morte e a diminuição da criminalidade.
Alguns destes especialistas defendem que a prisão perpétua seria uma melhor alternativa, por ser uma pena menos drástica, mas com igual capacidade de tirar da rua os criminosos mais perigosos.
Porém, um outro grupo de especialistas estadunidenses, formado principalmente por economistas, publicou uma série de trabalhos comparando o número de execuções em determinadas regiões dos Estados Unidos com seu histórico de homicídios. O resultado encontrado por um desses estudos, elaborado pelos economistas da Universidade de Houston Dale Cloninger e Roberto Marchesini, mostrou que cada execução realizada no estado do Texas evitou entre 11 e 18 homicídios durante o período analisado.
Para Joel Birman, psicanalista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), aprovar a volta da pena de morte no Brasil é ignorar os diversos problemas sociais enfrentados no país. Para ele, aqueles que defendem a pena de morte são pessoas pertencentes sobretudo às elites brasileiras, que ignoram o fato de já existir uma espécie de pena de morte no país, que é a violência diária que ocasiona diversas mortes entre as camadas mais pobres da população.
Portanto, enquanto os defensores da pena de morte afirmam que ela é a única solução para impedir que criminosos voltem a cometer crimes na sociedade, os que são contra a pena capital acreditam que ela não teria qualquer efeito, já que nenhum criminoso deixa de cometer um crime acreditando na possibilidade de ser punido. Para eles, o papel das prisões é ressocializar o preso, dando a ele chances de retorno ao convívio em sociedade.
Ainda que a pena de morte seja repudiada por inúmeras organizações de direitos humanos do mundo todo, ela continua a ser uma prática em diversos países. Segundo relatório apresentado 6 ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 170 dos 193 países que integram a ONU já aboliram a pena de morte ou não a praticam mais há pelo menos 10 anos. Cerca de 102 deles já aboliram a pena capital em todos os tipos de crime.
Contudo, 23 países aplicaram a pena de morte em 2016. Os principais deles são Irã, Paquistão, Arábia Saudita e Iraque, que juntos foram responsáveis por 87% das práticas de pena de morte durante o ano. Acredita-se que a China seja a nação com maior número de aplicações da pena de morte, na casa de milhares, mas como o governo coloca os dados como secretos, a pena de morte do país não entra para as estatísticas.
Nos Estados Unidos a prática tem sido cada vez menos frequente. Entre os 31 estados onde a pena de morte ainda é legal, 10 renunciaram a esse tipo de punição. Dos 50 estados no país, 29 já não empregam mais a pena capital.
Os motivos que levam a uma pena de morte podem ser bem definidos ou abstratos, de acordo com a constituição de cada país. Segundo a Anistia Internacional, os motivos mais recorrentes em 2016 foram crimes relacionados às drogas, sequestro, estupro, blasfêmia ou “insulto ao profeta do islã”.
Houve ainda casos de pena capital para espionagem, traição, colaboração com entidades estrangeiras, questionar políticas do líder local ou participação em movimentos de insurreição ou terrorismo. As execuções podem ser feitas de diversas formas, como enforcamento, apedrejamento, fuzilamento ou injeção letal.
Ao todo, foram registrados 1.032 aplicações de pena de morte em 2016, 37% a menos que no ano anterior. Ainda assim, existem hoje 18.848 pessoas no corredor da morte ao redor do mundo sendo que ainda que a pena de morte seja um processo legal nos países que a aplicam, diversas etapas são desrespeitadas durante esse procedimento.
A Anistia Internacional aponta como alguns dos problemas as confissões obtidas por meio de tortura, imposição de pena de morte automática para alguns tipos de crime, sem qualquer julgamento e diversos outros desrespeitos às regras firmadas por acordos internacionais.
QUANDO A ÚLTIMA PENA DE MORTE FOI APLICADA NO BRASIL?
O governo imperial aprovou em 1835 uma lei dedicada a punir exemplarmente os negros que matavam seus senhores, mas dom Pedro II decidiu abandoná-la em 1876.
A pacata cidade de Pilar, na província de Alagoas, amanheceu tumultuada em 28 de abril de 1876. Calcula-se em 2 mil o público de curiosos, inclusive vindos das vilas vizinhas, que se aglomerou para assistir à execução do negro Francisco.
O escravo fora condenado à forca por matar a pauladas e punhaladas um dos homens mais respeitados de Pilar e sua mulher. O assassino recorreu ao imperador dom Pedro II, rogando que a pena capital fosse comutada por uma punição mais branda, como a prisão perpétua. O monarca, poucos dias antes de partir para uma temporada fora do Brasil, assinou o despacho: não haveria clemência imperial.
Fonte: Agência Senado
Acorrentado ao carrasco e com a corda já no pescoço, Francisco percorreu as ruelas da cidade num cortejo funesto até o ponto em que a forca estava armada. Na plateia havia escravos, levados por seus senhores para que o caso lhes servisse de exemplo.
— Peço perdão a todos, e a todos perdoo — disse ele, antes de morrer, à multidão atônita.
Há mais de 140 anos, essa foi a última pena capital executada no Brasil. Depois de Francisco, nenhum criminoso perdeu a vida por ordem judicial. Encerrava uma prática que vinha desde o Descobrimento — basta pensar no índio que o governador-geral Tomé de Souza mandou explodir à boca de um canhão em 1549 ou em Tiradentes, enforcado e esquartejado em 1792, ou ainda no frei Caneca, fuzilado em 1825.
Galés perpétuas
Francisco, porém, foi condenado com base numa lei de 1835 que mirava exclusivamente os negros cativos. Ela dizia que seria condenado à morte o escravo que matasse ou ferisse gravemente seu senhor ou qualquer membro da família dele. Talvez essa tenha sido a lei mais violenta e implacável de toda a história brasileira. A norma não admitia a hipótese de o criminoso continuar vivo — pelas leis anteriores, havendo atenuantes, ele poderia ser condenado à prisão ou a galés perpétuas (trabalhos forçados para o governo), no lugar do enforcamento.
Além disso, a lei de 1835 exigia o voto de apenas dois terços dos jurados do tribunal para a condenação à forca — até então, a pena capital requeria a unanimidade do júri. E, por fim, ela não permitia apelações pela mudança da pena — antes, o condenado podia interpor inúmeros recursos judiciais às instâncias superiores.
O historiador Ricardo Figueiredo Pirola, autor de Senzala insurgente (Editora Unicamp), diz:
— Havia pena de morte para os livres que cometiam homicídio, mas para eles a legislação continuou como antes, com alternativas à forca. O endurecimento afetou só os cativos. De 1835 em diante, escravo condenado era escravo enforcado: “lance-se logo a corda e pendure-se o réu”.
Documentos históricos mantidos sob a guarda do Arquivo do Senado, em Brasília, mostram que o projeto da lei de 1835 foi proposto pela Regência como forma de conter as crescentes rebeliões escravas. A Regência foi o governo-tampão da conturbada década de 1830, entre a abdicação de Pedro I e a maioridade de Pedro II.
“As circunstâncias do Império em relação aos escravos africanos merecem do corpo legislativo a mais séria atenção. Alguns atentados recentemente cometidos contra fazendeiros convencem dessa verdade”, escreveu o ministro da Justiça no preâmbulo do projeto, remetido à Câmara e ao Senado em 1833. “A punição de tais atentados precisa ser rápida e exemplar.”
Os “atentados recentemente cometidos” a que o ministro se refere ocorreram nas províncias da Bahia, de São Paulo e de Minas Gerais, onde escravos atacaram seus senhores por não mais aceitarem castigos violentos e trabalhos extenuantes ou por serem vendidos para outros pontos do país, sendo separados da família, por exemplo.
O caso mais rumoroso ocorreu em São Tomé das Letras, no sul de Minas Gerais, em 1833, e ficou conhecido como Revolta de Carrancas. Escravos fizeram uma espécie de arrastão pelas fazendas da região, matando famílias inteiras de latifundiários.
Fonte: Agência Senado
Terror
Episódios desse tipo deixavam a elite rural aterrorizada. Havia o temor de que se produzisse algo semelhante à Revolução Haitiana, onde os negros haviam se revoltado, assumido o poder e abolido a escravidão. A elite não teve dificuldades para ver o projeto contra os negros prosperar. Primeiro, porque a lavoura era o grande motor da economia, e o Império tinha total interesse em protegê-la. Depois, porque os próprios políticos, na maioria, eram escravocratas.
Entre as vítimas de Carrancas, estavam parentes do deputado Gabriel Francisco Junqueira (MG), que só escapou da matança porque se encontrava na Câmara, no Rio, não em sua fazenda. Um dos regentes da Regência Trina Permanente (1831- 1834) foi José da Costa Carvalho, dono de vastas terras e dezenas de escravos em São Paulo.
Também os senadores tinham escravos. Da tribuna do Palácio Conde dos Arcos, a sede do Senado, o senador Silveira da Mota (GO) defendeu a lei de 1835 narrando um incidente familiar:
— "Chegando ontem a minha casa, minha família recorreu a mim, assustada por um fato que tinha se dado no meu lar doméstico. Um escravo meu, apenas mui brandamente advertido, insubordinou-se a ponto de, armado, ameaçar minha mulher. Felizmente, minha filha mais velha teve o bom senso de conter a indignação que o fato tinha excitado e de apelar somente para minha chegada. É um crioulo de casa, que é muito bem tratado e há poucos dias tinha recebido dinheiro de minhas mãos."
Foi a trágica Revolta de Carrancas que apressou a elaboração do projeto da severa lei de 1835. A insurreição se deu em maio de 1833 e logo no mês seguinte a Regência apresentou a proposta. A aprovação ocorreu sem sobressaltos. O texto passou duas vezes pela Câmara e uma pelo Senado, sofrendo alterações mínimas. Entretanto, muito pouco se sabe sobre o teor das discussões no Senado. Em 1834, o senador Marquês de Caravelas (BA) apresentou um requerimento para que o debate fosse secreto, por ser “pouco político” tratar em público de um tema tão delicado. Um dos documentos da época guardados no Arquivo do Senado explica que, “apesar da oposição de alguns ilustres senadores”, o pedido foi aceito.
Um grande levante negro na Bahia acelerou a aprovação definitiva do projeto. Foi a Revolta dos Malês, em Salvador. O saldo dos embates entre cativos e soldados foi de dezenas de mortes. A revolta explodiu em janeiro de 1835, a segunda aprovação da proposta na Câmara veio em maio e a sanção da Regência ocorreu em junho.
Manobra imperial
Nas duas primeiras décadas, a lei de 1835 levou centenas de escravos rebeldes à forca. Aos poucos, porém, dom Pedro II foi afrouxando as condenações. Em 1854, ele decidiu que todo escravo condenado à punição capital ganharia o direito de apelar à clemência imperial, pedindo o perdão ou pelo menos a comutação da pena, assim como já ocorria com os brancos.
O monarca cada vez mais cedia às súplicas. A última execução de um homem livre ocorreu em 1861. Os escravos precisariam de mais tempo para se livrarem da pena capital. Francisco, o negro de Pilar, foi enforcado em 1876.
Apesar de os tribunais continuarem sentenciando a pena de morte até o fim do Império, em 1889, as forcas foram definitivamente aposentadas uma década antes. E isso aconteceu sem que se revogasse a lei de 1835, apenas com as repetidas clemências imperiais. De acordo com o historiador Ricardo Alexandre Ferreira, autor do livro Senhores de poucos escravos (Editora Unesp), a manutenção da lei, mas sem sua execução, foi uma decisão calculada de dom Pedro II:
— "O imperador era contrário à pena de morte, mas sabia que despertaria a ira das elites agrárias que lhe davam sustentação se abolisse oficialmente a lei que as protegia. Preferiu agir com cautela e manter a lei."
— "Quem poupa a vida de um grande malfeitor compromete a vida de muitos inocentes — afirmou o senador Ribeiro da Luz (MG) numa sessão plenária em 1879. — Não é possível que, por causa da filantropia, homens vivam inquietos pelos perigos que os cercam, sobressaltados de que a foice ou a enxada do escravo venha tirar-lhes a vida."
Os escravocratas, cientes da manobra, passaram a reclamar publicamente, exigindo o cumprimento da lei. Os senadores diziam em tom de ironia que dom Pedro II estava sendo “filantrópico”.
Há várias hipóteses para a aversão do imperador às execuções. Uma das mais plausíveis é que ele foi influenciado pelas ideias do escritor francês Victor Hugo, crítico ferrenho da escravidão e da pena de morte. Dom Pedro II foi recebido duas vezes em Paris pelo autor de O Corcunda de Notre-Dame naquela longa temporada no exterior iniciada logo após negar clemência ao escravo Francisco. De fato, depois dessa viagem, ninguém mais no Brasil foi para a forca.
Linchamentos
Na mesma sessão, os senadores lembraram um crime coletivo ocorrido em Itu, em São Paulo, no começo do ano. Um escravo havia assassinado seu senhor, um dos poucos médicos da cidade. Enfurecidas, centenas de pessoas tentaram invadir a delegacia para linchar o criminoso, mas foram contidas pela polícia. No dia seguinte, voltaram e conseguiram arrancar o escravo da cela. O negro foi morto a pauladas pela população aos gritos de “viva a justiça do povo!”
Para os senadores, linchamentos como aquele, que se repetiam em outras cidades, eram um claro sinal de que a sociedade — vendo que os cativos, livres da pena de morte, se sentiam encorajados a assassinar — não tinha escolha senão fazer justiça com as próprias mãos. O senador Silveira da Mota foi ainda mais longe e disse que, já que a lei de 1835 havia sido esquecida, o melhor seria acabar de vez com a escravidão:
— "Nós sabemos que a escravidão é uma violência e uma injustiça, mas as violências se mantêm senão com outras violências. Se quereis fazer filantropia à custa da honra das famílias dos proprietários, então tomai a responsabilidade da emancipação [dos escravos]. Não o queirais fazer tortuosamente, com prejuízo de tantas vidas. Num país de escravidão, se o governo quer harmonizar a lei criminal com os princípios filosóficos, então o meio é outro, é acabar com a escravidão. Enquanto não acabar com ela, o meio é a lei de 1835".
Ainda em 1879, o presidente do Conselho de Ministros (cargo equivalente ao de primeiro- -ministro), Cansanção de Sinimbu, compareceu ao Senado para defender o imperador. Ele argumentou que dom Pedro II concedia a clemência não por bondade, mas por identificar falhas nos processos judiciais:
— "Todos nós sabemos como têm lugar esses assassinatos. Acontecem em lugares solitários, na ausência de pessoas que possam testemunhar e, por conseguinte, na dificuldade de se constituírem provas positivas para se fazer um juízo sobre a criminalidade do réu."
O primeiro-ministro não contou toda a história. Quando o processo era perfeito, sem deixar dúvida de que o escravo matou seu senhor, o imperador simplesmente engavetava o pedido de clemência. Assim, em vez de ir para a forca, o negro continuava na prisão indefinidamente, à espera de uma palavra final do monarca que jamais viria.
A lei da pena de morte dos escravos deixou de fazer sentido em 1888, com a abolição da escravidão. Ela só foi oficialmente revogada em 1890, logo depois da Proclamação da República.
ARQUIVO NACiONAL
Arquivo do Senado
Jornal do Senado
ANTONIO A. BELELLI
Mestre em Educação e Especialista em Ciências Políticas
ISABELA SOUZA
Especialista em Ciências Sociais